Seminário 10 anos de Ações Afirmativas: Conquistas e Desafios

Por Marcos Paulino (LACED/UFRJ)

Nos dias 21 e 22 de novembro de 2012 foi realizado na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) o Seminário 10 anos de Ações Afirmativas: Conquistas e Desafios. Evento do Laboratório de Políticas Públicas (LPP) e da Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais (FLACSO) por meio do projeto do Grupo Estratégico de Análise da Educação Superior (GEA), que tem apoio da Fundação Ford.

Contou com cerca de 200 convidados, entre gestores de IES públicas brasileiras, representantes de movimentos sociais, pesquisadores que atuam na área das Ações Afirmativas e representantes do Ministério da Educação (MEC). Além de criar espaço de diálogo entre os participantes o evento se propunha a celebrar os 10 anos da implementação de Ações afirmativas na Uerj.

Rita Potiguara (Coordenadora Geral de Educação Escolar Indígena e ex-membro do Conselho Nacional de Educação) e Gersem Baniwa (Diretor -presidente do Centro Indígena de Estudos e Pesquisas/CINEP e Professor da Faculdade de Ciências da Educação/UFAM) também estiveram presentes, além de universitários indígenas de etnias e instituições distintas.

No primeiro dia, após a Abertura, na Mesa 1: As ações afirmativas no Brasil: um balanço foram expostos dados gerais sobre as Ações Afirmativas em curso nas universidades públicas do país. A Lei Federal 12.711/2012, apesar de celebrada, rendeu intenso debate sobre sua normatização. Muitas intervenções dos convidados apontaram para o “engessamento” das categorias propostas pelo MEC através da Portaria Normativa nº 18, que trata da implementação das reservas das vagas previstas em lei nas instituições federais de ensino.

Neste sentido, ficaram claros possíveis retrocessos que a implementação da lei poderá trazer para o acesso dos povos indígenas na universidade, principalmente: i) pela categorização que a Lei 127111/2012 prevê, onde indígenas concorrem às mesmas vagas que pretos e estudantes de escolas publicas, o que desconsidera as especificidades da educação indígena e do seu ingresso enquanto representantes de coletividades; ii) pela redução do número de vagas oferecidas em algumas IFES, realidades vitoriosas para o acesso dos povos indígenas à universidade terão retrocessos (como a diminuição expressiva do número de vagas) para se enquadrar no que prevê a Lei 12711/2012.

Ainda no tocante aos povos indígenas, neste primeiro dia, Antonio Carlos de Souza Lima (LACED/MN/UFRJ) levantou questão que rendeu bastante discussão entre os convidados: Afinal, o que estamos chamando de Ações Afirmativas? As Licenciaturas Interculturais são consideradas Ações Afirmativas ou não? Obviamente esta e outras discussões não se encerraram.

No segundo dia a Mesa 2: Políticas de permanência deu sequência às discussões anteriores e trouxe novas. Destacamos a contribuição de Álamo Pimentel (UFBA), que frisou a convivência intra universitária como fator crucial para a discussão da permanência. Ficaram nítidos após discussão a vulnerabilidade e preconceito que o estudante indígena sofre hoje na universidade pública brasileira, o que mais uma vez o coloca em condição específica de permanência. Esta realidade foi evidenciada após riquíssimos relatos dos professores Walter Silvério (UFSCAR) e Maju (Maria José Cordeiro, Uems).

A Mesa 3: Monitoramento das Políticas de Ação Afirmativa trouxe forte demanda dos convidados em relação à publicização dos dados relacionados ao ingresso e à permanência de cotistas, em particular pelas Pró Reitorias de Graduação. Em muitas universidades não se sabe quem são os cotistas após seu ingresso. Destacou-se a falta de informação ainda maior sobre o setor privado, principalmente dos estudantes assistidos pelo PROUNI.

André Lázaro (Uerj e FLACSO-Brasil) frisou que atualmente, em relação às políticas afirmativas no ensino superior, temos uma realidade federal (que se enquadra nas questões levantadas na implementação da Lei 12711/2012) mas há distintas realidades estaduais, das federais e entre si, muitas vezes sem reconhecimento governamental ou orçamento previsto. Ficou clara esta diferenciação em relação aos povos indígenas. Como exemplo, há em curso programas estaduais para acesso de indígenas – tão antigos quanto o da Uerj – casos da Universidade Estadual do Mato Grosso do Sul (Uems) e das IES estaduais paranaenses.

A Mesa 4: sessão comemorativa 10 anos de cotas no Brasil: perspectivas foi aberta ao público, dedicada a celebrar os 10 anos de cotas na Uerj, homenageando o Reitor da Universidade Ricardo Vieiralves e lideranças do movimento negro, como Frei Davi (EDUCAFRO) e Mario Theodoro (IPEA e SEPPIR).

Cabe destacar que representantes do governo federal estiveram presentes durante todo o evento, como Thiago Thobias (assessor do Ministro da Educação Aloisio Mercadante) e Renato Ferreira (SEPPIR).

Ao final do evento foi aprovado, consensualmente, um documento chamado “Carta do Rio”, onde os participantes do Seminário elencam 12 medidas consideradas necessárias para consolidação das políticas de Ação Afirmativa. Tal carta tem propósito de divulgar recomendações oriundas das fecundas discussões do Seminário, e será amplamente divulgada.

Há muito em que os movimentos indígenas devem ser ouvidos nessa discussão. As especificidades de sua identificação étnica, de seu acesso, suas demandas e cosmovisões próprias, seus compromissos com suas coletividades, as peculiaridades de sua difícil permanência na universidade careceram de maior representatividade indígena, embora tenham sido questões da pauta do Seminário.

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